quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Narrações do Infinito de Camille Flammarion (trecho)

A MORTE NÃO EXISTE

[...]
Quaerens - Se bem me recordardes, a partir do momento em que, mãos trêmulas, eu vos fechei os olhos. Gostaria que daí partisse a vossa origem.

Lúmen - Oh! A separação do princípio pensante e do organismo nervoso não deixa na Alma nenhuma espécie de recordação. E' como se as impressões do cérebro, que constituem a harmonia da memória, se apagassem inteiramente e fossem logo restabelecidas sob outro modo. A primeira sensação de identidade que experimenta depois da morte assemelha-se à que se sente ao despertar, durante a vida, quando, acordando pouco a pouco, à consciência da manhã, ainda se está penetrando pelas visões da noite. Chamado pelo futuro e pelo passado, o Espírito busca, por seu turno, retomar a plena posse de si mesmo e deter as impressões fugitivas do sonho esvaecido, que passam ainda nele com o respectivo cortejo de quadros e acontecimentos. Ás vezes, absorvido em tal retrospecção de um sonho cativante, sente sobre as pálpebras, que de novo se fecham, os elos tênues da visão reatados, e o espetáculo prosseguir; recai então, no sonho e numa espécie de meio-sono. Assim se balança nossa faculdade pensante ao sair desta vida, entre uma realidade que não compreende ainda e um sonho não desaparecido completamente. As mais diversas impressões se amalgamam e confundem, e se, sob o peso de sentimentos perecedouros, tem a saudade da terra de onde vem exilado, é então oprimida por um sentimento de tristeza indefinível que pesa sobre nossos pensamentos, nos envolve de trevas e retarda a clarividência.

Quaerens - Experimentastes essas sensações imediatamente depois da morte?

Lúmen - Depois da morte? Mas não existe morte. O fato que designamos sob tal nome, a separação do corpo e da Alma, não se efetua - por assim dizer - sob uma forma dita material, comparável a separação química de elementos dissociados que se observa no mundo físico. Não se percebe essa separação definitiva, que vos parece tão cruel, mais do que a pode perceber o recém-nascido, saindo do ventre materno. Somos verdadeiros nascidos para a vida celeste, tal qual fomos para a existência terrestre. Apenas, não estando a alma envolta nas faixas corporais que revestem na Terra, adquire ela mais prontamente a noção do seu estado e da sua personalidade. Tal faculdade de percepção varia todavia - essencialmente - de uma pra outra Alma. Há as que durante o viver nunca se elevaram rumo do céu, nem sentiram o desejo de penetrar as leis da Criação. Essas, dominadas ainda pelos apetites corporais, permanecem logo tempo em estado de perturbação e de inconsciência. Outras existem, felizmente, que, desde esta vida, voaram com as suas aspirações aladas rumo aos cimos do belo eterno. Estas, vêem chegar com calma e serenidade o instante da separação; elas sabem que o progresso é a lei da existência, que entraram no Além, numa vida superior a de aquém; seguem, passo a passo, a letargia que sobe ao coração e, quando o seu curso, elas estão já acima do corpo e daí já observam o adormecimento. Libertando-se dos liames magnéticos, sentem-se rapidamente arrebatadas por uma força desconhecida rumo ao ponto da Criação, a que as suas aspirações, sentimentos e esperanças as atraem.

Quaerens - A palestra que ora inauguro convosco, meu caro mestre, traz à memoria os diálogos de Platão sobre a imortalidade da Alma; e igual a Fedro que o solicitava a seu mestre, Sócrates, no próprio dia em que este devia beber a cicuta - para obedecer a iníqua sentença dos Atenienses - ; eu vos pergunto, ó vós, que haveis transposto o termo fatal, que diferença essencial distingue a Alma do corpo, de vez que este pertence, enquanto que a primeira não morre jamais.

Lúmen - Não darei a essa questão uma res­posta metafísica, qual a de Sócrates, nem uma solução dogmática, qual a dos teólogos, mas uma resposta científica, porque vós, tal qual eu, dais valor somente aos fatos constatados pelos métodos positivos. Ora, pode-se distinguir no ser humano três princípios diferentes, ainda que reunidos: 1ª:, o corpo material; 2.ª, o corpo astral; 3ª, a Alma. Menciono-os nessa ordem para seguir o método a posteriori. O corpo material é uma associação de moléculas, formadas elas próprias de agrupamentos de átomos. Os átomos são inertes, passivos, governados pela força, e entram no organismo pela respiração e pelos alimentos, renovam incessante­mente os tecidos, são substituídos por outros, e, eliminados, vão pertencer a outros corpos. Em al­guns meses, o corpo humano é totalmente reno­vado, e nem no sangue, nem na carne, nem no cérebro, nem nos ossos resta mais um único dos átomos que constituíam o todo alguns meses antes.
Por intermédio da atmosfera, principalmente, os átomos viajam sem cessar de um para outro corpo. A molécula de ferro é sempre a mesma, quer esteja incorporada ao sangue que pulsa sob a têmpora de um homem ilustre, quer pertença a um vil fragmento enferrujado. A molécula de oxigênio é idêntica, brilhe no olhar amoroso da noiva, ou, reunida ao hidrogênio, projete sua flama em um dos mil luzeiros das noites parisienses, ou, ainda, tombe em gota de água do alto das nuvens. Os corpos vivos atualmente são formados da cinza dos mortos, e, se todos os mortos ressuscitassem, faltariam aos vindos por último muitos fragmen­tos pertencentes aos primeiros. E, durante a vida mesmo, numerosas mudanças ocorrem, entre ami­gos e inimigos, entre homens, animais, plantas, trocas que causariam singular espanto ao olhar analisador. Quanto respirais, comeis ou bebeis, já foi respirado, bebido ou comido milhares de vezes. Tal é o corpo: um complexo de moléculas materiais que se renovam constantemente.
O corpo astral é, por assim dizer, imaterial, etéreo, fluídico. E' por ele que o Espírito está associado ao corpo material; é o envelope da Alma, a substância física do Espírito.
Pela energia vital, a Alma grupa as moléculas, seguindo certa forma, e constitui os organismos.
A força rege os átomos passivos - incapazes de se conduzirem eles próprios, inertes; a força os chama, faz que lhe obedeçam, toma-os, coloca-os, dispõem todos conforme certas regras e forma esses corpos tão maravilhosamente organizados que o anato­mista e o fisiologista contemplam. Os átomos são permanentes; a força vital não. Os átomos não têm idade; a força vital nasce, envelhece, morre. Um octogenário não é mais idoso do que o jovem de quatro lustros. Porquê? Os átomos que o cons­tituem estão, naquele, apenas há alguns meses, e, além disso, não são nem velhos, nem novos; ana­lisados, os elementos constitutivos do seu corpo não têm idade. Que envelheceu, pois, no octogenário? A sua energia vital, a qual outra coisa não é que uma transformação da energia do Universo, e es­gotada no corpo. A vida se transmite pela geração. Ela mantém o corpo instintivamente sem ter consciência dela própria: tem um começo e um fim; é uma força física inconsciente, organizadora e con­servadora do corpo.
A Alma é um ser intelectual, pensante, ima­terial na essência. O mundo das idéias, no qual vive, não é o mundo de Matéria: não tem idade, nem envelhece; não muda em um mês ou dois, igual ao corpo, pois, decorridos ano, lustro, decênio, sentimos que conservamos a nossa identi­dade, que o nosso Eu permanece. De outro modo, se a Alma não existisse, se a faculdade de pensar fosse função do cérebro, não poderíamos continuar a dizer que temos um corpo: este seria o corpo que teríamos na ocasião. Além disso, de período em período, nossa consciência mudaria, não possuiríamos mais a certeza, nem mesmo o sentimento da nossa identidade, e não seríamos mais responsáveis pelas resoluções segregadas pelas moléculas que haviam passado por nosso cérebro muitas de­zenas de meses antes. A Alma não é a força vital, pois esta é mensurável, transmite-se por geração, não tem consciência intrínseca, nasce, aumenta, declina e morre... estados diametralmente opostos aos da Alma, imaterial, imensurável, intransmissível, consciente. O desenvolvimento da força vital pode ser representado geometricamente por um fuso que inche insensivelmente até ao meio e depois decresça até anular-se na outra extremidade. No meio da vida, a Alma não desincha (se  pode usar a comparação) para diminuir em forma de fuso e ter um fim, mas continua a abertura da sua parábola - lançada no Infinito. Além disso, o modo de existência da Alma é essencialmente di­verso do da vida. E' um modo espiritual. O sen­timento do justo ou do injusto, do verdadeiro ou do falso, do bom ou do mau; o estudo, as matemá­ticas, a análise, a síntese, a contemplação, a admiração, o amor, o afeto ou a antipatia, a estima ou o desprezo, em uma palavra, as preocupações da Alma, quaisquer que sejam, pertencem à ordem intelectual e moral, que os átomos e as forças físi­cas não podem conhecer, e que existe tão verdadei­ramente quanto à ordem material. Jamais o tra­balho químico ou mecânico das células cerebrais, por mais sutil que se suponha, poderia dar em resultado um julgamento intelectual, por exemplo, concluir que 4 multiplicado por 4 é igual a 16 ou que a soma dos três ângulos de um triângulo é igual a dois ângulos retos.
Esses elementos da entidade humana são en­contrados no conjunto do Universo: 1.°, os átomos, os mundos materiais, inertes, passivos; 2.°, as forças físicas, ativas, que regem os mundos e que se transformam umas nas outras; 3.° Deus, o Espírito eterno e infinito, organizador intelectual das leis matemáticas às quais as forças obedecem... ser incognoscível, no qual residem os princípios su­premos do verdadeiro, do belo e do bem.

A alma é ligada ao corpo material pelo corpo astral, intermediário, que ela conserva depois da morte. Quando a vida se extingue, a Alma se se­para naturalmente do organismo, e cessa qualquer relação imediata com o Espaço e o Tempo, pois não tem densidade alguma, nem peso. Depois da morte, ela se encontra desprendida do corpo e permanece maior ou menor interregno na atmosfera. Relativamente livre, a Alma pode deslocar-se facilmente e, às vezes, projetar-se mesmo a imensas distância, com a rapidez do pensamento. Sabeis que do Sol a Terra, ou desta aos planetas, a gravitação se transmite quase instantaneamente com uma ve­locidade maior do que a da luz. A transmissão da Alma, mônada-psíquica, no Espaço, é da mesma ordem. Assim, estamos no céu, imediatamente de­pois da morte, de igual modo que o havíamos es­tado, aliás, durante todo o período da existência. Somente não temos mais o peso que nos prende ao Planeta. Acrescentarei, todavia, que a Alma de­mora algum tempo em desprender-se do organismo nervoso, e, por vezes, permanece muitos dias, meses mesmo, magneticamente ligada ao antigo corpo que não deseja abandonar. Não raro, conserva, por largo período, seu organismo fluídico, além de que, dotada de faculdades especiais, pode transportar-se rapidamente de um ponto a outro do Espaço.
[...]

Acho que muitas dúvidas, não somente sobre essa questão da morte, foram "resolvidas" mesmo que momentaneamente, até surgir novas dúvidas, com relação a vida ou sobre quem ou o que eu sou, e por que me sinto tão desnorteada e ao mesmo tempo não consigo me adaptar.
Recomendo a qualquer pessoa que deseja conhecer a realidade da vida, das suas origens, e gosta de sempre buscar o conhecimento.

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